Mário, Mariozinho, Mário Maluco. Atendia por qualquer desses nomes com a maior simpatia possível depositada sobre seus um metro e noventa e quase cento e vinte quilos mais ou menos bem distribuídos, já que a musculação praticada de há muito, não conseguira acabar com a barriga cultivada pelos chopes e pizzas, que adorava.
Morava com os pais numa bela casa no Alto da Boa Vista, bairro de classe alta do Rio de Janeiro, mas que foram obrigados a abandonar, transferindo-se rapidamente para uma outra na Barra da Tijuca, já que os vizinhos incomodados com os fortes miados que vinham do fundo do seu quintal, descobriram ali uma organizadíssima criação de onças que o Mariozinho tratava com mesma naturalidade dos que colecionam figurinhas...
Perguntei-lhe, um dia, se não tinha receio de um ataque daqueles felinos e me respondeu serenamente: "Não, desde o dia que aquela ali (o bicho pesava uns oitenta quilos) quis se fazer de engraçadinha e foi jogada contra o muro com um golpe de caratê. Ah, sim, esqueci de dizer que o rapaz era faixa preta nesse esporte.
Certo dia, deu um leve esbarrão num carro que freara bruscamente no centro da cidade. O motorista do veículo abalroado, talvez temeroso pelo tamanho do motorista do outro carro, saiu de seu automóvel portando uma barra de ferro e o Mário, sem o menor pudor, colocou uma das mãos na cintura e a outra na testa e numa de suas hilariantes imitações de "gay deslumbrado" (termos dele) iniciou uma gritaria em plena rua, chamando a divertida atenção dos passantes: "Socooorrrooo... O homem quer me bateeerrr". O sujeito, espantado, voltou para seu carro e foi embora. Explicação do Mário: "Se ele viesse mesmo, eu seria obrigado a machucá-lo..."
Esse era o Mário, Mariozinho, Mário Maluco, companheiro dos tempos de faculdade de Direito e que pretendia, depois de formado, fazer Mestrado e Doutorado no exterior numa época em que esses cursos eram raros e muito caros por aqui. Tinha "bala na agulha" para alcançar seus sonhos.
Eis que o tempo passa e, espantado, vejo o seu rosto na televisão pregando ardentemente uma religião em rede nacional, brandindo a Bíblia como se fosse a tal barra de ferro que lhe ameaçara um dia. A voz rouca e em tom entusiasticamente alto, fazia referências aos escritos sagrados e dava exemplos que comprovavam suas palavras. Eu conhecedor da "figura", confessei-me perplexo e resolvi achar o paradeiro daquele, agora, pastor.
Fui encontrá-lo num elegante templo e me reconheceu de imediato, saudando-me com um abraço quase sufocante daquele "armário" ainda semi-atlético e que me contou em menos de uma hora, sua vida.
Um casamento acabado e a quase morte do filho, salvo, garante, pelo poder das orações de um grupo cristão postado diariamente ao lado do leito do menino, nessas alturas, desenganado.
Mudou quando a criança se restabeleceu e resolveu dar uma "guinada" na vida intensa levada até então. O próspero escritório de advocacia passado para um companheiro, a admissão numa faculdade de Teologia e, hoje, na minha frente, era outro homem que me falava.
Não renunciou à fortuna deixada pela família e à vida confortável, mas agora tinha outra visão das coisas e, ainda assim, consguia vez por outra fazer-me lembrar do Mário que conheci. Nada, além disso.
Com todo respeito por sua opção, não posso deixar de afirmar que o outro, o Mário, Mariozinho, Mário Maluco, era bem mais divertido...
Nenhum comentário:
Postar um comentário