quarta-feira, 18 de junho de 2008

HERÓI SEM QUERER

Eram mil os contatos que tinha mundo afora, mas naquele momento necessitava, apenas, de um número telefônico que insistia em não completar a ligação.

A mulher contorcia-se em espasmos e gritava de dor. O parto estava em franco andamento e só ele poderia ajudá-la. Nem em filmes prestava atenção a essas histórias e, exceto pela água quente e pano limpo, cuja necessidade ecoava em sua mente, mas que jamais saberia onde e como usar, ajoelhou-se na frente da mulher que, deitada no chão da tapera onde morava no meio daquele matagal, postou-se numa posição que, em outro momento e situação, teria lhe dado um enorme prazer. Pediu a Deus para ajudá-lo.

Não queria, mas só pensava no por que parara o carro atendendo ao aceno da menina que agora olhava assustada para a mãe deitada e para ele, como se perguntasse o que estava acontecendo ali.

Em poucos minutos rompia a cabeça cabeluda de uma criaturinha morena e que logo foi totalmente expulsa do corpo da mãe e não se fazendo de rogada, explodiu num choro que parecia informar estar dispensando os tapas usuais na ocasião.

A própria mãe instruiu quanto ao cordão umbilical e pronto, ali estava uma outra menininha que, minutos mais tarde, sugava o seio da jovem senhora.

Só aí o telefone conseguiu funcionar e em quinze minutos os homens da ambulância do Corpo de Bombeiros chegavam até ele. Foi cumprimentado pelo médico da equipe e elogiado por ter se portado com a frieza que só Deus sabe como manteve.

Saiu dali e rumou direto para casa. Deixou o carro mal estacionado e subiu os cinco lances pela escada, dispensando o elevador, abriu a porta e foi recebido pela mulher assustada, olhando para ele. Não agüentando o nervosismo, falou com um sorriso forçado:

- Não imagina o que acabei de fazer...

Ela, com uma das mãos sobre o peito e a outra tapando a boca, respondeu com a voz tremida:

- Esse sangue na sua roupa... Oswaldo, pensei que não teria coragem... Você matou o gato da vizinha!

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